Lutar contra a balança. Vencer o consumo excessivo de álcool ou outras drogas que viciam. Quem enfrentou o problema ou conhece alguém nesta situação sabe como esse é um caminho tortuoso, no qual abundam obstáculos.
E as palavras importam, muito. A questão vai além do politicamente correto: termos estigmatizantes prejudicam o tratamento e põem em risco a qualidade de vida dos pacientes. No estudo “Say what you mean, mean what you say: the importance of language in the treatment of obesity”, publicado na revista da Sociedade Americana de Obesidade, pesquisadores mostraram como a linguagem negativa é amplamente utilizada no tratamento dos pacientes, comprometendo o relacionamento com os profissionais de saúde e o engajamento na batalha para perder peso. A própria terminologia empregada nos trabalhos sobre cirurgias bariátricas embute uma carga pejorativa, com o uso de palavras como “fracasso” e “morbidez”.
O mesmo se aplica aos que se empenham contra a dependência do álcool e outras drogas: viciado, alcoólatra e junkie são expressões que causam dor, vergonha e provocam o afastamento. “Nossa linguagem revela o que pensamos das pessoas e afetam as políticas públicas”, diz Michael Botticelli.
Em 2017, quando era diretor de políticas para o controle de drogas no governo Obama, ele foi autor de um memorando propondo termos mais neutros. Nos EUA, o número de mortos por overdose supera o de vítimas de acidentes automobilísticos e estima-se que quase 90% dos indivíduos que precisam de ajuda não a recebem. No documento, enfatizava que o preferível seria “pessoa com distúrbio de uso de substância”, no lugar de abuso e dependência, indicando que este é um estado do qual é possível livrar-se e que não pode ser encarado como o resultado de um fracasso pessoal.
Pesquisas apontam que esses pacientes são vistos com preconceito maior do que aqueles com deficiências físicas ou doenças psiquiátricas. Botticelli também sugere descartar expressões como “ficar limpo” – por causa da carga negativa de “estar sujo” – e adotar “pessoa em recuperação” ou “indivíduo sem fazer uso de substâncias”. Quem tem problemas com opioides, por exemplo, costuma necessitar de outras drogas para superar sua condição, o que não quer dizer que o “vício” permaneça, já que está sob monitoramento médico.