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Biografia de Marília Mendonça mostra paixão por livros e revela verso feito para a mãe aos 7 anos

O legado e a influência de Marília Mendonça dentro da música brasileira serão propagados por muito tempo desde a sua morte, em novembro do ano passado após um acidente aéreo na serra de Caratinga, em Minas Gerais. Nesta sexta-feira (22), data em que completaria 27 anos, a “Rainha da Sofrência”, ganha a primeira obra biográfica feita depois da tragédia.

Escrito pelo jornalista de Campinas (SP) Bruno Ribeiro, o livro descortina a vida da cantora desde o início, revive o auge e a revolução comandada por ela dentro do sertanejo e revela aspectos pouco explorados como a paixão pela literatura. O gosto por escrever – que inclusive é uma das origens do talento da artista para compor – era tão grande que começou ainda na infância, tanto que a biografia revela um poema feito por Marília aos 7 anos para a mãe, dona Ruth.

“O que mais me chamou atenção é o amor dela pelos livros e pela literatura, e como isso influenciava o processo criativo dela. Tem um capítulo só sobre isso. Por exemplo, o autor preferido da Marília era o Bukowisk [Charles Bukowisk, escritor alemão que morreu em 1994], ela tinha na estante uma biografia da pintora Frida Kahlo. Ela diz que começou a ler muito na infância porque era tímida, então se apegava aos livros, e nisso surge o poema que ela escreveu aos sete anos para a dona Ruth, um poema muito bonito”, disse o autor.
O pequeno verso escrito por Marília ainda menina fala da relação dela com dona Ruth e diz que “nem no infinito” o amor dela pela mãe terá “ponto final”. Além de Bukowisk, a artista também gostava muito de literatura brasileira e norte-americana, e durante a pandemia chegou a indicar livros aos seguidores nas redes sociais. Entre as obras, estavam “A morte de Ivan Ilitch”, do escritor russo Liev Tolstói, reconhecido como um dos maiores de seu tempo.

Ao g1, Ribeiro detalhou todo o processo de pesquisa e produção do livro “Marília Mendonça, a Rainha da Sofrência – Biografia e Crítica”, que será lançado no perfil do Instagram dele (@brsamba) na noite desta sexta-feira. A obra, com 15 capítulos e 270 páginas, ainda cataloga as 331 composições registradas pela cantora e apresenta comentários do autor para parte delas.

De onde veio a ideia?
Bruno Ribeiro é letrista de samba, crítico musical e trabalhou na imprensa de Campinas na área de cultura durante dez anos. Apesar de nunca ter sido tão ligado ao sertanejo, o jornalista sempre foi fã da música romântica do Brasil – uma influência da mãe – e se encantou pela autenticidade de Marília e pelo quanto ela conseguia sintetizar todo o sentimento do povo brasileiro em suas composições e forma de cantar.

“Quando ela morre, eu fiquei muito abalado e me questionei porque eu tinha ficado tão abalado com a perda de alguém que não fazia parte da minha bolha musical. E eu concluí que ela era uma de nós. Ela era essencialmente popular e sintetiza tudo aquilo que somos”, contou Ribeiro, que teve um encontro a compositora, em 2016, durante uma entrevista para o lançamento do primeiro disco dela.

Após a morte da artista, ele decidiu escrever um texto sobre ela, que até então tinha a pretensão de ser apenas um perfil biográfico. No entanto, o material coletado na pesquisa se mostrou tão rico que ele percebeu que aquilo poderia ser transformado em livro. A partir daí, foi um mergulho na imprensa escrita, internet, programas de TV, rádios e nas redes sociais de Marília para compor a biografia. O autor também fez algumas entrevista com fãs e pessoas que conheciam a cantora.

“Pesquisei centenas de reportagens e artigos em veículos do Brasil inteiro. Garimpei muito, foi muito material coletado. Comparei tudo para ver se não haviam contradições e fui agrupando para construir o enredo. Também utilizei algumas entrevistas que ela deu, inclusive trechos da entrevista que eu fiz com ela, para compor o livro”, explicou.

A revolução Marília Mendonça
Marília Mendonça é reconhecida dentro da música sertaneja por ter comandado uma das revoluções mais importantes da história do segmento ao cantar o amor e os relacionamentos do ponto de vista feminino de uma forma que não havia acontecido anteriormente. Com isso, ela fez o gênero ganhar outros horizontes e abriu caminho para que mais mulheres se tornassem protagonistas dentro do segmento, o que gerou o movimento conhecido como “feminejo”.

O protagonismo de Marília no sertanejo é abordado na biografia, assim como o fenômeno de repercussão que foi seu primeiro disco, “Marília Mendonça – Ao vivo”, em 2016, depois dela ter construído uma carreira já consolidada como compositora. A obra da cantora, inclusive, ganhou um novo capítulo na noite de quinta-feira (20), com o lançamento de um EP póstumo de quatro músicas extraídas de uma live realizada em abril de 2021.

“Ela tinha uma sensibilidade muito grande para compor e para escolher músicas falando do amor próprio, do empoderamento, e tudo de uma maneira muito espontânea. Ela nunca se disse ligada a nenhuma corrente do movimento feminista. Ela tinha uma postura libertária no sentido de ser uma mulher livre muito natural e ao mesmo tempo muito romântica, o que fazia ela uma personagem até contraditória em alguns momentos”, pontuou o autor.
Marília e as relações
O livro começa em 5 de novembro de 2021, data do acidente de avião que tirou a vida de Marília e outras quatro pessoas, e depois retorna para Cristianópolis (GO), onde a cantora nasceu, para contar toda a história dela.

A obra foca nas relações da artista com a família, desde as brigas dos pais na infância que a faziam se trancar no quarto com os ouvidos tampados e cantarolando para não ouvir os gritos, até a cumplicidade com a mãe, a força da amizade com Maiara e Maraisa e Henrique e Juliano, e o trabalho ao lado de Juliano Tchula, seu maior parceiro de composição.

“Eu resgato também todo o processo de construção da música sertaneja, desde a moda de viola lá na década de 1910, para explicar como surge uma Marília Mendonça. Eu sinto ela um patamar acima dentro da música sertaneja justamente por incorporar esse espírito da música romântica. Eu defendo essa tese no livro e vou além, eu vejo a Marília como uma cantora de boleros, ainda que esses boleros fossem revestidos com um roupagem pop, que cabem embaixo do guarda chuva do sertanejo”, completou.

adminn

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