A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Uberlândia se posicionou na noite desta quinta-feira (6) sobre as declarações de xenofobia da advogada Flávia Aparecida Rodrigues Moraes. Em vídeo publicado das redes sociais, ela afirmou que “não vai mais alimentar quem vive de migalhas”, se referindo à população nordestina (veja o vídeo acima).
No posicionamento, o presidente da OAB Uberlândia, José Eduardo Batista, informou que o órgão decidiu por exonerar Flávia do cargo de vice-presidente da Comissão da Mulher Advogada. Ela já havia pedido licença do posto após o vídeo circular nas redes sociais.
“Reiteramos que não compactuamos com os lamentáveis fatos veiculados nas redes sociais, nem com as expressões usadas pela advogada”, declarou o presidente. Também nesta quinta, a Defensoria Pública de Minas Gerais propôs uma ação civil pública contra Flávia. O órgão pede que a advogada pague R$ 100 mil em danos morais.
Flávia declarou que se arrepende do que disse, mas que a conduta, embora reprovável, “não se encontra tipificada como crime em qualquer dispositivo legal vigente”. Confira o posicionamento na íntegra mais abaixo.
Posicionamento da OAB
Além de exonerar a advogada da comissão, a OAB Uberlândia afirmou, em nota, que também determinou a abertura de processos éticos-disciplinares pelo Conselho de Ética e Disciplina da Subseção e pelo Tribunal de Ética Regional, em atenção aos pedidos de representação disciplinar protocoladas por advogados e autoridades de Uberlândia e região. “Apresentamos nossas sinceras desculpas ao povo nordestino e em especial à advocacia nordestina e advocacia brasileira pelas manifestações ofensivas da referida advogada, postadas nas redes sociais”, completa a nota.
Ação civil pública
Em nota enviada à imprensa, o defensor público Evaldo Gonçalves da Cunha afirmou que a indenização será destinada a entidades de combate ao preconceito, racismo e xenofobia. A advogada também deverá se retratar das declarações pelas vias adequadas.
“A ré propaga falas preconceituosas e discriminatórias, causando um constrangimento ao povo nordestino de magnitude imensurável”, escreveu. No texto da ação, a Defensoria Pública declara que o objetivo do processo é “o reconhecimento dos direitos de milhões de brasileiros nordestinos, sejam os lá residentes ou os que de lá se originam, de terem respeitada a sua identidade, como corolário da dignidade da pessoa humana”.
O órgão indica que a advogada teria explicitamente incitado a discriminação do povo nordestino, o que configura o crime de “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”. Quando cometido em um meio de comunicação social, como a internet, a pena prevista para o crime é reclusão de dois a cinco anos e multa. “Em que pese o direito de liberdade de expressão ser constitucionalmente garantido, tal direito não é absoluto e deve ser exercido em observância à proteção à dignidade da pessoa humana”, aponta a ação.
Entenda o caso
Flávia Aparecida Moraes publicou um vídeo em uma rede social dizendo que “não vai mais alimentar quem vive de migalhas”, se referindo aos moradores da região Nordeste do Brasil. Vestidas com as cores verde e amarela, ela e mais duas mulheres não identificadas fazem um brinde enquanto deixam claro que não irão mais àquela região turística do Brasil e que preferem gastar o dinheiro no Sul e Sudeste ou até fora do país.
Na descrição do vídeo, Flávia ainda escreveu: “Lamentavelmente mais necessário, precisamos ser racionais. Democracia é democracia (sic)”. Na publicação, o áudio da advogada é quase encoberto pela música ao fundo, mas é possível identificar o que ela diz:
“A todos aqueles brasileiros que a partir de hoje têm que ser muito inteligente. Nós geramos empregos, nós pagamos impostos e sabe o que que a gente faz? A gente gasta o nosso dinheiro lá no Nordeste. Não vamos fazer isso mais. Vamos gastar dinheiro com quem realmente precisa, com quem realmente merece. A gente não vai mais alimentar quem vive de migalhas. Vamos gastar o nosso dinheiro aqui no Sudeste, ou no Sul ou fora do país, inclusive porque fica muito mais barato. Um brinde a gente que deixa de ser palhaço a partir de hoje”, disse Flávia Moraes.
Segundo a 13ª Subseção da OAB, a advogada pediu licença do cargo que ocupava na entidade para se dedicar pessoalmente sobre o assunto. Já a OAB-MG informou, na quarta-feira (5), que vai tomar as providências cabíveis no âmbito ético disciplinar. “A OAB repudia de forma veemente as expressões utilizadas que materializam preconceito e discriminação contra o povo nordestino. Caracteriza um tipo de xenofobia regional intolerável, inadmissível. A OAB MG recomenda à OAB de Uberlândia que independente da licença requerida pela colega a destitua do cargo porque ela não tem condições de participar desta gestão”, disse o presidente da ordem mineiro, Sérgio Leonardo em vídeo publicado em rede social.
O que disse Flávia
“Em razão de manifestação pessoal publicada em minhas redes sociais, venho a público me desculpar por compreender a infelicidade do que foi falado, uma vez que é totalmente incompatível com meus valores. Minha conduta, embora reprovável, não se encontra tipificada como crime em qualquer dispositivo legal vigente.
A exposição da minha fala foi feita por terceiros, sem o meu consentimento, e fez com que eu siga atacada com as mais diversas formas de violência contra a mulher, tendo que blindar a mim e minha família. A infelicidade da minha fala não pode autorizar ou justificar a prática de crimes graves contra a minha pessoa, que vão desde injúria e difamação, até mesmo a apologia ao estupro. Em um Estado Democrático de Direito os fins não justificam os meios.
Lamento pela repercussão desta infeliz colocação e me arrependo profundamente pelo ocorrido, desculpando-me com todas as pessoas de origem nordestina que tenham se sentido ofendidas, retratando-me completamente.”
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